Professor
Silvio Prado
Não
pense que é coisa fácil organizar uma quadrilha para faturar alto nos
corredores do poder. Quantas horas de sono se perde, quanto tempo se fica longe
da família e quantas reuniões, noite afora, todo quadrilheiro é obrigado a
fazer em salas e salões reservados de lugares como hotéis ou mesmo casa de
campo de alguém pertencente ao bando.
Cada
passo da quadrilha deve ser devidamente calculado, cada ação extremamente
pensada. Nada deve ser improvisado. Tudo precisa ser extremamente profissional
e mostrar aparência digna de empresas bem sucedidas. Até que se decida como
agir e quais objetivos devem ser atingidos pelo bando em formação, cada
quadrilheiro precisa se portar como homem digno e de família, cidadão
respeitável, honradíssima pessoa interessada inclusive no bem público. O
quadrilheiro profissional precisa ter aparência social impecável e não deve
portar manchas que o coloquem como suspeito de qualquer coisa.
Formar
uma quadrilha num mudo sem ética como o nosso é um verdadeiro risco porque o
que prevalece entre os quadrilheiros, inclusive entre quadrilheiros
engravatados, é uma desconfiança geral e absoluta, mesmo que todos tenham feito
o juramento de que serão fiéis um ao outro até mesmo diante de algum delegado
incorruptível da Policia Federal. Não importa se o quadrilheiro é católico ou
evangélico, umbandista, espírita. De nada vale sua fé religiosa. O que vale é o
seu elevado espírito de quadrilha, mesmo que alguns se emocionem e façam impressionantes
orações depois de um roubo bem sucedido.
Quando
a quadrilha é formada para roubar dinheiro público através, por exemplo, de
licitações fraudulentas, aí o couro come de verdade pois o dinheiro do Estado,
sempre muito bem vigiado, é coisa grandiosa e desperta um apetite desgraçado em
todo mundo. Não pense que é coisa fácil obter informações privilegiadas em
algum setor do estado e depois usá-las de maneira conveniente para negócios
escusos feitos dentro da lei. Para que a coisa funcione bem e gere negócios
lucrativos, é sempre bom incluir na quadrilha alguém próximo de algum
secretário de estado ou pessoas próximas de algum manda chuva de qualquer
fundação ou organismo público que tenha cofres poderosos. Algumas poderosas
quadrilhas que agem dentro ou nas imediações do estado são estimuladas muitas
vezes por funcionários graduados, secretários presidentes de fundação, como
alguns fatos recentes acabam de provar.
Todo
mundo sabe que meter um trezoitão na cara de um bobo numa viela e arrancar dele
um celular vagabundo é coisa de despreparado ou nóia embalado pelo crack.
Porém, partir para fraudar ou truncar licitações públicas e arrancar montanhas
de dinheiro do estado é bem mais complexo. Não basta apenas querer, é preciso
saber e conhecer os detalhes, meandros, caminhos e descaminhos legais e ilegais
por onde vai entrar ou sair o dinheiro que tanto interessa. Isso é coisa para
advogados espertíssimos, contadores habilitados, políticos, burocratas de
carreira ou gente que, mesmo não merecendo confiança nenhuma, ocupa sempre
cargos de confiança na máquina pública.
Até que
se consiga botar a mão na dinheirama e depositá-la num cofre particular, vai
uma longa e extenuante história que geralmente é bem sucedida, mas pode se
desdobrar em equívocos e perder o rumo se um dos parceiros (ou empresa) se acha
prejudicado, perde o juízo e, por pura vingança, revela o esquema para o
primeiro promotor público que encontra pelo caminho.
Enfim,
formar uma quadrilha para ganhar rios de dinheiro vindo dos cofres públicos é
sempre bom enquanto dá certo, principalmente num país onde a corrupção, depois
do futebol, é o maior esporte nacional. A corrupção é um grande negócio que às
vezes, muito raramente, pode dar até cadeia. No entanto, mesmo que ganhe um
rápido tempo de cadeia ou constrangimentos públicos, o autor da corrupção quase
sempre é devidamente perdoado e, depois de morto, certamente terá o nome
solenemente glorificado numa placa de rua, ou poderá até virar nome de escola e
de creche, repartição pública, estádio de futebol, bairro, cidade...
Quantos
heróis da nossa idolatrada pátria amada não usufruiu largamente da fartura de
nossos cofres públicos?